Quase um ano se passou desde que, neste mesmo espaço, o Greenpeace anunciou que resgatar o planeta de um colapso climático, a despeito das piores previsões da ciência, era possível. Bastava vontade política dos líderes mundiais, reunidos então na 15ª Conferência de Clima da ONU (COP15), em Copenhague, em chegar a um acordo global para reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Os governos, infelizmente, não cumpriram seu dever.
De lá pra cá, os termômetros não deram trégua. Assistimos a eventos climáticos extremos, como secas, tempestades, ondas de calor e invernos atípicos. A comunidade científica trouxe novos alertas da perda da nossa biodiversidade, da morte dos corais nos mares, do derretimento das geleiras e do aumento do nível das águas, o que já coloca em risco a vida de milhares. O mundo, enquanto isso, continuou a investir em energias poluentes, destruir nossas florestas e poluir os mares.
A partir do dia 29 de novembro, representantes de 193 países terão nova chance de reverter este quadro, reunidos em Cancún, no México, para a próxima Conferência de Clima, a COP16. Marcada pela ressaca do fracasso em Copenhague, a COP16 reunirá menos líderes e não alimenta esperança de um acordo mundial definitivo. Por outro lado, tem como desafio – e obrigação – desatar uma série de nós deixados para trás no fechar das portas da reunião anterior.
“Existem entraves sérios na negociação sobre um acordo climático global que precisam ser resolvidos em Cancún e que simplesmente não podem esperar até a próxima Conferência (na África do Sul, em 2011)”, diz Nicole Figueiredo, coordenadora da Campanha de Clima do Greenpeace no Brasil.
A principal lição de casa continua a ser estabelecer metas globais ambiciosas de redução de emissão de gases do efeito estufa. Para isso, é preciso que os países finalmente deixem de lado suas preocupações domésticas em prol de um bem comum – o que não tem sido feito inclusive pelo Brasil.
Pendengas
Na agenda de discussão está o futuro do Protocolo de Kyoto, com prazo até 2012. Entre os cenários possíveis estão a revisão das metas até 2020, ou a criação de um novo acordo, com outro nome e novos prazos.
“Não podemos continuar à espera dos Estados Unidos, que não ratificaram Kyoto, aderirem a um acordo global”, diz Nicole. Isso porque muitos países, de China aos europeus, com freqüência usam a ausência americana para justificar suas próprias omissões.
China, assim como Brasil e Índia, figuram entre os maiores emissores de gases-estufa e, por isso, precisam fazer parte ativa do jogo, apesar de serem nações em desenvolvimento. “O Brasil tem metas de redução tímidas e poderia fazer muito mais. É um país com potencial de energia renovável imenso, mas investe em combustível fóssil e nuclear. Além disso, corre o risco de aprovar alterações drásticas em sua legislação florestal, abrindo portas para mais desmatamento”, conclui Nicole, referindo-se às propostas de mudança no Código Florestal, articuladas pela bancada ruralista no Congresso.
Entre os outros gargalos está o estabelecimento de um fundo climático, idealizado na COP15 para financiar medidas de adaptação nos países mais pobres, que já sofrem com as consequências das mudanças climáticas. Ele prevê ainda recursos para mitigação das emissões e transferência de tecnologia entre países.
Apesar de os países ricos, que doarão o dinheiro, concordarem com a teoria, o fundo nunca saiu do papel. É como escrever um cheque, mas não o assinar. O imbróglio está em quem vai comandar este fundo e definir quem vai receber o dinheiro e quando.
Também precisam avançar as discussões sobre REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), mecanismo de proteção de nossas florestas nativas que estabelece um mercado de carbono para compensar a manutenção das matas em pé. Para isso, é preciso que as regras deste mercado sejam definidas, para garantir que o recurso chegue à mão de quem precisa, com transparência no processo.
“A COP16 será um momento de resolver pendências e burocracias, pavimentando o caminho para, o quanto antes, fecharmos um acordo global. O burocrata que viajar até Cancún e não conseguir resolver ao menos os pontos básicos não deve ter direito nem de pegar o avião de volta pra casa”, diz Nicole.
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